|
Imagem do Google |
Quero neste dia, dedicá-lo a senhora que foi tudo aquilo que é preciso para ser uma grande mulher!
Dedicou sua vida a servir, foi enfermeira sem nunca ter feito um curso, foi mãe sem nunca ter tido filhos biológicos!
Ficou solteira por opção, teve dois pretendentes: um primo (na época era comum casamento entre primos) o rejeitou, ele casou-se com uma das suas irmãs. O outro, um comerciante, ela achou que seu sapato fazia muito barulho, “rangia muito”, e tinha o habito de viver “limpando a garganta emitindo sons”, o que ela achava muito esquisito, ela o rejeitou também para desgosto da família, pois era um ótimo partido!
Dedicou o seu tempo aos trabalhos manuais, bordava muito bem enquanto minha Vó fazia crochê. Com a ajuda dos irmãos casados dava muito bem para o sustento de ambas, e ainda ajudar aqueles amigos mais necessitados, como a professora amiga que ensinou a maioria dos irmãos sem cobrar.
O lazer era: sendo muito católica, ir à igreja (que frequentava todos os dias, pois pertencia a irmandade das “Filhas de Maria”), cuidar das suas roseiras, que por sinal eram lindas e de seu pé de uva, que na safra até ajudava na manutenção da casa, e de suas plantas medicinais.
Era extremamente asseada! Hoje em dia dizia-se que tinha “toc” tal era sua exigência com a limpeza.
Um dos seus maiores feitos entre outros, foi quando surgiu um surto de Varíola na cidade, que dizimou quase toda a população. Quem primeiro contraiu a doença em casa foi minha vó, depois foram caindo os outros, onze irmãos ao todo! Sozinha cuidou de todos!
Na época era bem jovem, era a terceira dos doze irmãos, quando a casa foi marcada com uma “cruz” avisava que ali tinha casos de varíola ,enfrentou sozinha dois guardas que queriam levar para o isolamento todos que estivessem contaminados, o seu argumento foi o seguinte “que eles levassem primeiro os ricos e usineiros da cidade”.
O hospital, ou melhor, o isolamento foi construído as pressas, dentro do mato, bem longe da cidade, sem a mínima condição de higiene, eram muitos doentes para poucos cuidarem, era uma viagem sem volta! Ela cuidou de todos da família em casa.
Entre os doentes a minha avó foi a que apresentou um quadro mais grave, ficou sem roupa na folha da bananeira, seus cabelos caíram e sua pele escureceu, só após longo tempo foi voltado ao normal.
Os cuidados feitos por ela além de furar as “pústulas” era banhar todos varias vezes ao dia, tentar alimentá-los, limpar a casa, queimar alfazema para diminuir o odor da doença! À medida que os irmãos melhoravam a ajudavam nas tarefas.
Na convalescência aumentou o trabalho, pois para dar vencimento à quantidade de comida exigida pelos doentes, minha vó chegava a chorar de fome sem paciência de esperar que o alimento ficasse pronto, e era alimentada diversas vezes ao dia! Parecia uma “fome braba”, era o organismo reclamando do longo jejum!
Todos que ela cuidou escaparam da terrível doença, com poucas cicatrizes!
Mais tarde já adulta cuidou de muitos sobrinhos, e eu estava entre eles! Cuidou de minhas feridas do corpo e da alma, foi em seus braços que eu encontrei abrigo na adolescência para me curar de uma fraqueza extrema!
Ainda guardo seu cheiro bom de jasmim!
Amparou pessoas que viam do interior, na cidade a época só tinha um farmacêutico e ela para cuidar de todos aqueles que a buscavam.
Tuberculoso ela tratou de muitos! A família do doente tinha medo do contágio e a chamava para cuidar, até canjas gostosas ela fazia para ver se conseguia que os doentes se alimentassem! Sempre que eu voltava nas férias ela estava cuidando de alguém, só não consentia que eu fosse junto!
Ela nunca se contaminou e nunca aceitou pagamento pelo que fazia, a única doença que se queixava era uma tontura, talvez uma labirintite, mas ela já estava bem idosa nesta época!
Vou contar um caso jocoso que aconteceu. Ela estava na janela observando um pobre homem sentado na calçada com uma “corda de caranguejo” que ele tinha ganhado na feira.
Ela perguntou ao homem se ele estava com fome, ele respondeu que sim, dizendo “se tivesse alguém que cozinhasse esses caranguejos pra mim”, o qual minha tia respondeu “Que não seja por isso!”. Pegou os bichos cheios de lama, raspou suas patas, limpando bem (sua mania de limpeza), os colocou para cozinhar, indo a sua horta pegar coentro fresquinhos e outro temperos, dali a pouco o cheiro invadiu a casa! Ela ainda perguntou se ele gostaria que ela fizesse um “pirão”, o mesmo disse que sim.
Ela forrou uma mesinha na sala e o convidou para entrar, e toda orgulhosa foi buscar os dois pratos, um com os caranguejos e outro com o bendito pirão, ela só não contava com a reação do homem que soltou um “palavrão” dizendo que os caranguejos estavam mal cozidos ,o meu anjo também ficava braba! Disse “Sujeito mal agradecido leve seus caranguejos embora, você nunca teve fome!”.
A nossa reação foi sorrir vendo o seu desapontamento, que terminou rindo também!
A vida nos separou, casei, viajei, morei em outras cidades, mas quando voltava era em seus braços que me sentia criança outra vez!
Ela foi tudo para mim! A criatura mais perfeita que Deus colocou em meu caminho! Foi mãe, amiga, conselheira e enfermeira! O seu exemplo de vida eu procuro segui-los passando a minha família.
Ensinou-me a rezar a oração do Santo Anjo do Senhor, e eu pensava “pra que se eu já tenho meu Anjo!”
Onde estiver beijo as tuas mãos que só ajudaram fazendo o bem! Neste dia és a mulher escolhida por mim para homenagear!
Deus te abençoe! Celina
“In memoriam" de Sebastiana Alves Freire"
*Postagem publicada em 04 de março de 2010 em homenagem ao dia internacional das mulheres.